Governo Bolsonaro, dia 4: os primeiros bate-cabeças entre o Planalto e Guedes


Anúncio do presidente sobre aumento do Imposto Sobre Operações Financeiras e diminuição da alíquota do Imposto de Renda foram desmentidos por chefe da Casa Civil.


Governo Bolsonaro, dia 4: anúncios desencontrados sobre impostos. A frase resume os primeiros bate-cabeças públicos entre o presidente e a equipe econômica, que culminou com a palavra do  ministro-chefe da casa civil Onyx Lorenzoni, revelando o primeiro grande descompasso da nova gestão. O ruído aconteceu na manhã desta sexta-feira após Jair Bolsonaro afirmar que o ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciaria "a possibilidade de diminuir" a alíquota máxima do Imposto de Renda, que atinge os maiores salários. Ao mesmo tempo, Bolsonaro também anunciou que a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) seria elevada para compensar a prorrogação de benefícios fiscais às Regiões Norte e Nordeste. As falas do presidente foram, no entanto, desautorizadas ao longo do dia e chamadas de "confusão" e "equívoco" pelo secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, e por Onyx.

Diante do panorama, o superministro da Economia, Paulo Guedes, que já havia visto o presidente defender uma reforma da Previdência mais branda do que ele almejava, desmarcou os compromissos públicos. Preferiu o silêncio. O ministro-chefe da Casa Civil, no entanto, falou em seu nome para desmentir os anúncios do mandatário. "Paulo Guedes me ensinou que, antes (de diminuir impostos, precisamos sair desse buraco de 139 bilhões", disse, citando o déficit das contas públicas.
Tudo começou em evento da troca de comando da Aeronáutica, na manhã desta sexta-feira, Bolsonaro afirmou que havia assinado um decreto que elevava o IOF já que sancionou a lei que prorrogou até 2023 o incentivo fiscal concedido a empresas nas áreas da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). “Foi assinado decreto nesse sentido (elevação do IOF), mas para quem tem aplicações lá fora, para poder cumprir uma exigência do projeto aprovado como pauta-bomba, contra nossa vontade”, disse o presidente a jornalistas.
Poucas horas após a fala de Bolsonaro, o secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, afirmou, entretanto, que não haveria aumento do IOF. "[Bolsonaro] deve ter feito alguma confusão. Não há necessidade de compensação nenhuma. Há recursos previstos na lei orçamentária de 2019 para a ampliação", disse. Cintra também ressaltou que as mudanças de impostos viriam depois, "no tempo certo".
No fim do dia, foi a vez do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, chamar uma coletiva de imprensa no Palácio do Planalto para voltar atrás no anúncio do presidente. Segundo Onyx, Bolsonaro se "equivocou" ao anunciar que haveria aumento do IOF. Em relação à redução do Imposto de Renda, também anunciada pelo presidente e desmentida por Cintra, o ministro da Casa Civil disse que é uma "tese que vem lá da campanha", mas que deve ser tratada somente após o Governo conseguir equilibrar as contas públicas.
"Temos uma premissa que é obter o equilíbrio fiscal. Nós temos para este ano um déficit primário previsto de 139 milhões, claro que não podemos nesse momento fazer nenhuma ação que pode resultar em redução da arrecadação". A promessa do Governo é conseguir um superávit primário em dois anos.
Na avaliação do economista André Perfeito, da corretora Necton, o descompasso entre as falas de Bolsonaro e Onyx abre um ruído relevante na condução da política econômica. "As propostas de diminuição do IR e aumento do IOF soam improvisos na medida que não deixa claro o montante a ser arrecadado e se é relevante para resolver os desafios de curto prazo. A comunicação num ajuste do tipo ortodoxo é crucial uma vez que é no campo das expectativas que se opera a ancoragem de aspectos importantes, como os juros de longo prazo", disse.

Aumento da regressividade

Para a Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital, o anúncio feito presidente, agora jogado para futuro, quanto à redução de alíquota de imposto de renda (que cairia dos atuais 27,5% para 25%) é inconstitucional, porque é contrário ao critério da progressividade estabelecido no parágrafo 2º do artigo 153 da Constituição Federal. Segundo o presidente da entidade, Charles Alcantara, a medida é duplamente equivocada, do ponto de vista fiscal e do ponto de vista da justiça tributária, porque aumenta a regressividade do sistema tributário e amplia ainda mais o abismo entre ricos e pobres, uma vez que diminuiu impostos apenas para aqueles com maior poder aquisitivo.
“Quem ganha mais deve pagar mais impostos, quem ganha menos, deve pagar menos. Essa medida anunciada pelo novo governo vai favorecer uma parte da população, mas deixa de fora muitos brasileiros que ganham até dois salários mínimos, o que é um erro e favorece a desigualdade”, diz Alcantra em nota
Atualmente, a renda média do brasileiro é de dois mil reais por mês. A mudança anunciada por Bolsonaro reduziria a alíquota para aqueles com rendimento mensal acima de 4.664,68 reais, dos atuais 27,5%, para 25%.

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